Revistas acadêmicas de alto impacto revelam segredos do crescimento

Publicar estudos relevantes o suficiente para conseguir um número grande de menções é uma das metas dos autores - e das revistas.

Thiago Minami, especial para o USP Online

Rankings internacionais avaliam o impacto de publicações científicas com base no número de vezes que seus artigos são citados em textos de outros periódicos. Publicar estudos relevantes o suficiente para conseguir um número grande de menções é uma das metas dos autores – e das revistas.

Em julho deste ano a a Thomson Reuters divulgou o 2011 Journal Citation Reports, com os fatores de impacto das principais revistas científicas no mundo. Elas estão divididas em edições separadas para “Ciência” e “Ciências Sociais”, num total de 10.677 periódicos de 2.552 editores em 82 países.

Três revistas da USP conseguiram índices acima de um: a Clinics, do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina (FMUSP) está em segundo na relação. A Revista de Saúde Pública, publicada pela Faculdade de Saúde Pública (FSP), ocupa a quinta posição, e a Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, a décima sexta. As mais bem colocadas são as famosas Nature, com altíssimos 36,280 (a média mundial é de 2,5), e a Science, com 31,201. A Memórias do Instituto Oswaldo Cruz é a mais bem colocada brasileira, com 2,147.

“Há 10 anos, era impensável ter revistas brasileiras com índices acima de dois na área de medicina”.

É o que aponta o professor da FMUSP e editor da Clinics Maurício Rocha e Silva. “Isso mudou muito com os meios de veiculação online, por sites como o SciELO e a oferta gratuita de artigos brasileiros”, esclarece.

Os índices não podem ser comparados entre áreas diferentes de estudo. “Uma revista com dois pontos em um campo e outra com menos de um e outro podem ter a mesma relevância. O importante é tentar ficar acima da média de sua própria área”, explica o professor.

A Clinics tem 2,058 – há uma década, contava com menos de um ponto. Rocha e Silva lista os segredos para o salto no desempenho:

1.O idioma de publicação é o inglês, que é o padrão para as ciências exatas, biológicas e da saúde.
2. Um sistema online eficiente para recebimento e revisão de artigos, com controle preciso do fluxo pelos editores. A publicação também está inteira na internet, sem volumes impressos. “Foi assim que atraímos pesquisadores estrangeiros. Hoje contamos com muitos colaboradores de países como China e Turquia”, afirma o professor.
3. Controle rígido do que é publicado, com índice de rejeição de pelo menos 60% -no caso da Clinics, são recebidos cerca de 1 mil papers por ano, dos quais apenas 200 em média saem na revista. Para isso, é preciso contar com um grande número de revisores qualificados. “Todo mundo está sendo avaliado constantemente. Além dos artigos que recebemos, a própria revisão feita recebe notas dos colegas. Assim garantimos a qualidade”, diz.
4. “O título é o outdoor do artigo e o resumo é a vitrine”, compara Rocha e Silva. Ou seja, é preciso caprichar nos dois para atrair a atenção dos leitores e não deixar um bom conteúdo se perder pela falha na apresentação. “Títulos e resumos bons são aqueles que deixam claro, de modo organizado, o que está no artigo. Ninguém entra numa loja com a vitrine toda bagunçada, certo?”.
5. Divulgar a publicação em simpósios, conferências e outros meios acadêmicos, para que, aos poucos, o reconhecimento nas comunidades brasileira e internacional seja alcançado.

Divulgação é fundamental

As sugestões acima podem variar de acordo com as especificidades das áreas. Na Saúde Pública, por exemplo, o professor da FSP e editor da Revista de Saúde Pública José Leopoldo Ferreira Antunes acredita ser importante publicar artigos também em português, e não só em língua estrangeira. “Queremos impacto científico e social aqui no Brasil”, explica. Muitas pesquisas nesse campo de estudo são interessantes para leigos e podem afetar, por exemplo, políticas públicas.

O importante, diz Antunes, é desenvolver estratégias de diminuir custos de edição e publicação sem deixar de investir na divulgação. “Muitas revistas atrasam e tem problemas de periodicidade pela falta de recursos. Isso prejudica”, diz.

O Brasil ainda gasta pouco com ciência, o que se reflete diretamente nas revistas científicas. Nós investimos cerca de dez vezes menos que os Estados Unidos, segundo dados da Unesco referentes a 2007. E não é questão de apenas de ter menos recursos – em termos comparativos, participamos com 2,8% do produto interno bruto (PIB) mundial e apenas 1,8% nos gastos com ciência e desenvolvimento. Nos EUA, a relação é inversa. Eles têm uma participação maior nos gastos mundiais com ciência, com 32,6%, que no PIB, com 20,7%.

A maneira de driblar a falta de recursos, segundo Antunes e Rocha e Silva, é usar as plataformas digitais como aliadas. Elas ajudam a eliminar, por exemplo, os gastos com impressão e envio, ao mesmo tempo que levam os periódicos aos mais diversos pontos do planeta.

Humanas correm atrás

As Ciências Humanas são as que mais têm problemas para ampliar a divulgação de suas publicações. Se as biológicas já pensam alto – Rocha e Silva prevê publicações brasileiras com índices acima de três para os próximos dez anos –, áreas como Ciências Sociais e Comunicações encontram dificuldades ainda em questões básicas, como disponibilizar conteúdos na web e publicar em línguas estrangeiras.

O conteúdo dos estudos, por exemplo, torna as traduções mais complicadas. A tradição de compartilhar resultados na comunidade internacional também não é tão forte como nas outras ciências.

Uma das que tenta reverter o quadro é a Scientiæ Studia, publicada por pesquisadores do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e mantida pela Associação Filosófica Scientiæ Studia. São veiculados em meio impresso e online artigos em português e espanhol para aumentar a integração na comunidade acadêmica latino-americana. Segundo o fundador e presidente da associação, Pablo Mariconda, a revista já se tornou referência na Argentina.

“Muitos artigos são reescritos e ficam até um ano e meio para chegar no ponto que consideramos adequado”, comenta Mariconda, que também é professor do Departamento de Filosofia. A Scientiæ Studia está indexada no SciELO e no Qualis, da Capes, no qual tem nota A2 – a segunda mais alta na escala – em Filosofia e Teologia. “A Manuscrito, de Campinas, tem a nota máxima, mas é uma revista com 30 anos. A nossa conseguiu em dez anos chegar a esse patamar”, compara o professor.

A publicação começou em 2003. Um grupo de professores, pesquisadores e estudantes de pós do projeto temático “Estudos de Filosofia e História da Ciência” decidiu criar uma revista científica sobre o assunto. A dificuldade em manter o projeto financeiramente levou à fundação da associação, que também publica livros e promove palestras e eventos de divulgação científica.

Colaborou:  Paulo Fávari

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