Projeto de ICB e Unifesp diagnosticará imunodeficiências em recém-nascidos

Controle poderá rastrear crianças com deficiências imunológicas congênitas precocemente, possibilitando tratamento e cura.

Um promissor projeto de pesquisa desenvolvido no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP torna possível a identificação de diversas  doenças congênitas que afetam o sistema imunológico de crianças recém-nascidas, antes mesmo do aparecimento dos sintomas. A ideia é que os exames possam ser implantados na rede de saúde em até cinco anos, a partir da conclusão da pesquisa.

O estudo é realizado em parceria com a Escola Paulista de Medicina, ligada à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e propõe que os pacientes que nascem com certos tipos de deficiência nas defesas do organismo possam ser rastreados, identificados e tratados em menos tempo, atráves de um sistema de triagem, a exemplo do que ocorre com o Teste do Pezinho, adotado no Brasil desde 1976.

Segundo o professor do ICB, Antonio Condino Neto, um dos cientistas que encabeçam a iniciativa, “algumas dessas patologias podem fazer com que as crianças tenham expectativa de vida de apenas um ano, mas se houver diagnóstico apropriado e tratamento precoce – em geral, um transplante de medula óssea – elas poderão ser curadas e levar uma vida normal”.

A doença mais conhecida da população em geral que afeta o sistema imunológico é a aids, porém Condino esclarece que esta “é uma doença infectocontagiosa, cujo vírus tem a característica de atacar o sistema imunológico, diferentemente dos casos que pesquisamos, que se tratam de deficiências congênitas, de base genética”.

Imunodeficiências combinadas graves

Dentre as mais de 130 condições chamadas de imunodeficiências primárias (IDP), estão as SCID – do inglês Severe Combined Immunodeficiency, imunodeficiências combinadas graves, em tradução livre -, um grupo de 15 IDP consideradas mais agressivas, que são os principais alvos do projeto.

No exterior, a triagem neonatal das SCID vem sendo motivo de discussão há algum tempo. Nos EUA  foi implementada como programa piloto pioneiro no estado de Winsconsin, em 2008, após sete anos de tratativas a respeito. Há dois anos, a Secretaria de Saúde daquele país aprovou a adição das SCID ao teste de triagem neonatal padrão.

No Reino Unido, entre 1982 e 2010, dois centros de transplante de medula realizaram estudos comparativos de evolução clínica entre diagnósticos precoces (em bebês com até um mês de vida) e tardios (em crianças com até um ano e três meses de idade) de SCID, com resultados consideravelmente contrastantes. No grupo de pacientes diagnosticados tardiamente, houve uma mortalidade global de mais de 60%, enquanto no de pacientes identificados e tratados rapidamente, os óbitos chegaram a 10% do total, um dos quais teve o transplante recusado pelos pais.

Por conta destes tipos de resultado, ressalta Condino, o tempo é um fator determinante para evitar que as IDP em geral causem danos físicos permanentes às crianças, e também psicológicos e emocionais às mães e familiares: “de nada adianta diagnosticar um caso em uma criança de idade mais avançada, pois ela já deverá apresentar sequelas irreversíveis, o que causa, tanto nela própria como na mãe, limitações e sofrimentos que podem ser evitados”.

Implantação no Brasil

No Brasil, o número oficial de pacientes em tratamento contra IDP atualmente, é de cerca de 2.500, mas a perspectiva do projeto é de que, por baixo diagnóstico e desconhecimento das autoridades brasileiras e também dos profissionais da saúde no país, ainda haja por volta de 16 a 17 mil pacientes sem a identificação correta da patologia e, consequentemente, sem o tratamento adequado.

O projeto, que vinha contando com o orçamento anual de R$ 50 mil, com a verba disponibilizada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), realizou um período de testes em uma maternidade na cidade de São Paulo, e agora iniciará uma expansão, implantando o método em outros centros médicos.

Recentemente, a equipe, que conta com a colaboração de Beatriz Carvalho, Maria Isabel Pinto e Amelia Miyashiro, da Unifesp, estabeleceu um convênio com a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais no estado (APAE-SP). Com o apoio do presidente do Conselho Científico da entidade, Esper Cavalheiro, contará com uma estrutura, segundo Condino, que pode levar o projeto a uma larga escala e apresentar resultados maiores em um período de dois anos.

O objetivo final da pesquisa é levar os resultados finais ao conhecimento das autoridades nacionais, a fim de propor a adoção de mais esta triagem ao procedimento que já é feito no Brasil, minimizando a necessidade da criação de uma nova e eventualmente dispendiosa estrutura. Exigiria-se apenas a capacitação dos profissionais de saúde e aquisição dos equipamentos para análise das amostras de sangue coletadas. Um sistema robotizado de análise de amostras presente nos EUA, por exemplo,  em que um indivíduo monitora o funcionamento de um grupo de máquinas, pode examinar mais de 2.000 amostras por dia, aumentando significativamente a eficiência do procedimento.

A idealizadora e desenvolvedora ativa da pesquisa, Marília Kanegae espera que “o trabalho, que se mostra altamente benéfico, pelos aspectos apresentados, possa ser implantado e render frutos, salvando a vida das crianças imunodeficientes”. Dentro desta expectativa, considerando a apresentação dos resultados, as negociações com o Legislativo e aprovação do projeto, a implantação da Triagem Neonatal para detecção de IDP no país poderia levar por volta de cinco anos. 

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